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Empresas adiam entrega de balanço
As empresas de capital aberto decidiram deixar para a última hora a divulgação dos resultados anuais.
As empresas de capital aberto decidiram deixar para a última hora a divulgação dos resultados anuais. De acordo com levantamento realizado pela Gazeta Mercantil com base em dados da BM&F Bovespa, das 160 companhias listadas nos níveis diferenciados de governança corporativa da bolsa (Níveis 1 e 2 e Novo Mercado), apenas três divulgaram os balanços até o momento: Bradesco, Santos Brasil e Satipel. No mesmo período do ano anterior, 13 empresas já haviam apresentado seus números.
Uma das justificativas para o adiamento da entrega dos balanços é o complexo processo de adequação às regras de convergência aos padrões contábeis internacionais (IFRS). O agravamento da crise financeira, porém, alimenta especulações de que algumas empresas se preparam para dar más notícias ao mercado.
O caso mais emblemático é o da Aracruz. Conhecida por tradicionalmente inaugurar a safra de balanços, a produtora de papel e celulose, que sofreu perdas de US$ 2,13 bilhões com apostas equivocadas em derivativos cambiais exóticos, passou para o fim da fila e programou a divulgação dos resultados de 2008 para o dia 27 de março. A Sadia, que também teve prejuízo com derivativos e no ano passado publicou o resultado em 30 de janeiro, agendou a divulgação dos números de 2008 para 27 de fevereiro, data que, provavelmente, deve ser alterada por conta da necessidade de adequações, segundo a assessoria de imprensa da empresa.
Para a maior parte das empresas, o tempo adicional está sendo usado para adaptar os balanços às novas normas. "Ninguém quer correr o risco de errar e depois ser obrigado a republicar os números", afirma Sergio Romani, sócio da Ernst & Young, ao lembrar que 11 companhias precisaram refazer o balanço do terceiro trimestre, por determinação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). "Se isso ocorreu em um documento simples, como as informações trimestrais, a possibilidade de problemas na demonstração anual é muito maior."
A grande quantidade de dúvidas sobre como publicar as demonstrações contábeis levou a autarquia que regula o mercado de capitais brasileiro a soltar na última sexta-feira um ofício com 30 páginas para esclarecer alguns dos questionamentos. Enquanto isso, nos bastidores, os executivos das áreas financeiras das empresas têm conversado entre si a fim de verificar como cada um decidiu fazer o tratamento contábil.
Entre os pontos que têm apresentado mais controvérsia está a contabilização dos efeitos das mudanças na taxa de câmbio, explica o professor Ricardo José de Almeida, do Ibmec São Paulo. "A grande variação do dólar no ano passado tornou a implementação ainda mais difícil", diz. Os diretores financeiros das empresas também têm encontrado dificuldades para fazer o ajuste dos ativos e passivos a valor presente, outra norma que passou a ser exigida pela CVM. "Como cada ativo possui um risco diferente, ainda não se sabe exatamente qual será a taxa de desconto usada para se chegar ao valor presente", afirma, ao lembrar que ambos os temas foram tratados no ofício emitido pela autarquia na semana passada.
Existe ainda a questão fiscal, resolvida pelo governo apenas no final do ano passado, com a edição da medida provisória n 449, que tornou neutros os efeitos da transição da contabilidade brasileira para os padrões internacionais do ponto de vista do fisco. Apesar de positiva, a medida obrigou as companhias a fecharem dois balanços: um para fins fiscais e outro pela legislação societária, segundo o professor do Ibmec.
Efeitos da crise
A presidente do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), Ana María Elorrieta, não vê problemas mais sérios no adiamento da data de entrega dos balanços, desde que dentro do prazo legal. "O que interessa é a qualidade da informação", ressalta. Ela argumenta que as empresas tiveram pouco tempo para se preparar para algumas das regras. "Foram muitas as determinações do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) para instrumentalizar a lei ao longo do ano, inclusive em dezembro", lembra.
Para a presidente do Ibracon, a crise pode, de fato, ter influenciado a decisão das companhias de postergar a divulgação dos balanços, mas ela avalia que não há elementos concretos para determinar qual o grau desse impacto. Ela lembra que, ao exigir informações detalhadas das empresas a respeito das operações com derivativos já no balanço do terceiro trimestre, a CVM eliminou uma das principais preocupações dos investidores a respeito da saúde financeira das companhias.
O professor do Ibmec SP tem opinião semelhante. "Com exceção dos bancos, que precisaram aumentar as provisões para se proteger da inadimplência, os balanços das demais empresas no quarto trimestre ainda não devem trazer reflexos da crise." Segundo Almeida, os números devem começar a vir ruins a partir do primeiro trimestre deste ano, cujo prazo de divulgação acontece até 15 de maio.
Apesar de reconhecer as dificuldades de adaptação às regras contábeis, a corrida contra o tempo também se deve ao fato de muitas empresas terem deixado os ajustes para o último momento, de acordo com o gerente de pesquisa da Planner Corretora, Ricardo Tadeu Martins. "A justificativa dada por elas é a de que existem muitas dúvidas conceituais, para as quais os órgãos competentes não tinham respostas", relata. Ele lembra, por outro lado, que as incertezas na legislação não impediram que companhias como a Rossi Residencial trouxessem adequações às normas internacionais já nos balanços trimestrais do ano passado.
Para o analista, em alguns casos o atraso está sendo bem-vindo, sobretudo para as empresas em processo de renegociação de dívidas com bancos. "Conseguir apresentar esses acordos de débitos, sobretudo nos de curto prazo, no momento de divulgação do balanço ameniza o impacto negativo ao mercado", avalia.
Romani, da Ernst & Young, também considera difícil mensurar os efeitos da crise, mas acredita que algumas empresas podem ter optado por postergar a entrega do balanço anual por conta dos números ruins. "Quem tem notícia boa quer dar logo", resume. Diante da gravidade da crise, porém, o especialista afirma que o comportamento deveria ser o oposto. "Não há clima para esse tipo de atitude, e se isso estiver acontecendo o mercado cobrará o seu preço."(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 1)(Vinícius Pinheiro e Fabiana Batista)
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